Arquivo para download: Lygia Clark e o híbrido arte/clínica, por Suely Rolnik
Com os Objetos Relacionais, sua última obra, Lygia chega o mais perto que pôde desse ponto. Saquinhos de plástico ou de pano, cheios de ar, água, areia ou isopor; tubos de borracha, canos de papelão, panos, meias, conchas, mel, e outros tantos objetos inesperados espalham-se pelo espaço poético que ela criou num dos quartos de seu apartamento, ao qual deu o nome de consultório. São os elementos de um ritual de iniciação que ela desenvolve ao longo de "sessões" regulares com cada receptor. Mas a quê exatamente somos iniciados neste seu consultório experimental? À vivência do desmanchamento de nosso contorno, de nossa imagem corporal, para nos aventurarmos pela processualidade fervilhante de nosso corpo-vibrátil sem imagem. Uma viagem tão intensa a este além da representação que, por uma questão de prudência, Lygia deixava uma pedrinha na mão do receptor/paciente durante toda a sessão, para que pudesse, à exemplo de Joãozinho e Maria, encontrar o caminho de volta. Volta para o familiar, o conhecido, o doméstico; volta para a forma, a imagem, o humano - a "prova da realidade", como se referia Lygia a este aspecto de seu ritual. Assim a iniciação que se dá no consultório experimental de Lygia não tem rigorosamente nada a ver com expressão ou recuperação de si, nem com a descoberta de alguma suposta unidade ou interioridade, em cujos recônditos se esconderiam fantasias, primordiais ou não, que se trataria de trazer à consciência. Pelo contrário, é para o corpo-ovo que os Objetos Relacionais nos levam. Estes estranhos objetos criados por Lygia têm o poder de nos fazer diferir de nós mesmos.
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