Arquivo para download: Comentário sobre o livro "Nietzsche e o círculo vicioso", de Pierre Klossowski, por Selmo Gliksman
Quando um livro cujo conteúdo se coaduna com os nossos interesses e parece responder aos nossos mais profundos anseios - e por que não, angústias - nos vem às mãos, é possível, devido a um autêntico e legítimo sentimento de júbilo e entusiasmo, afirmar com segurança que jamais nossos olhos tiveram o prazer de contemplar tais e tais palavras, que jamais nenhum livro falou e expressou tão precisamente aquilo que, todavia, vínhamos sentindo - mesmo inconscientemente - já há muito tempo, mas não sabíamos ou não podíamos nomear. Nietzsche e o círculo vicioso, de Pierre Klossowski, parece incluir-se nesse caso...
Para Nietzsche, separar a obra conceitual de um filósofo, seus juízos e conclusões é um grave erro, e estes não podem em absoluto ser vistos como compostos autônomos que nada têm a ver com a forma de este mesmo indivíduo comer, amar, trabalhar, enfim, tudo o que compõe a vida de alguém, seus caprichos e idiossincrasias, dores e alegrias, está, para Nietzsche, irremediavelmente vinculado à produção de um pensamento.
A fim de compreendermos os mecanismos daquilo que chamamos de razão ou consciência, é necessário coragem para compreender até que ponto elas estão, irremediavelmente, comprometidas com a fisiologia ou a constituição pessoal de alguém. Porém, Nietzsche vai além e diagnostica, ao declarar, no seu Zaratustra, que "há mais razão em teu corpo do que na própria essência de tua sabedoria", que a preferência de alguém por este ou aquele pensamento nada mais é do que o indicador da sua constituição pessoal, e como, para ser digno de crédito, o pensamento de um filósofo deve, segundo o próprio Nietzsche, ser o reflexo de sua própria existência e sua existência o reflexo de seu pensamento, estabelecer o vínculo entre a vida e o pensamento passa a ser não só lícito mas até mesmo um teste ou uma espécie de termômetro para medirem-se a sinceridade, a integridade intelectual e o vigor de qualquer pensador.
Comentários