Arquivo para download: A vida e o espírito do senhor Benoit de Spinosa, por Jean Maximilian Lucas
"Ele imputava a maior parte dos vícios dos homens aos erros do entendimento, e com medo de cair neles, se afunda ainda mais na solidão, deixando o lugar onde estava para ir a Voorburg, onde acreditou que teria mais repouso.
De início ele só foi visitado por um pequeno número de amigos, que o faziam moderadamente. Mas este lugar agradável não ficava nunca sem viajantes, que procuravam ver o que merecia ser visto, os mais inteligentes dentre eles, quaisquer que fossem suas condições, acreditavam ter perdido a viajem se não tivessem visto Spinosa. E como os efeitos respondem ao renome, não havia sábio que não lhe escrevesse para ter esclarecidas suas dúvidas. Testemunha disto é o grande número de cartas que fazem parte do livro que foi impresso após sua morte. Mas tanto as visitas que recebia quanto as respostas que devia dar aos sábios que lhe escreviam de toda parte, e suas obras maravilhosas, que fazem hoje nossa alegria, não ocupavam suficientemente este grande gênio. Ele empregava todos os dias algumas horas a preparar lentes para microscópios e telescópios, no que era excelente, de forma que se a morte não lhe tivesse sobrevindo, é de se crer que tivesse descoberto os mais belos segredos da ótica. Ele era tão entusiasmado pela busca da verdade, que, apesar da saúde muito débil e da necessidade de repouso, o fazia, no entanto tão pouco, que ficou três meses inteiros sem sair de casa; até ao ponto de recusar ensinar publicamente na Academia de Heidelberg, por medo deste emprego lhe distrair de seu desígnio.
Após ter-se esforçado tanto para retificar seu entendimento, não há porque se admirar de que tudo o que tenha produzido é de um caráter inimitável. Antes dele a Sagrada Escritura era um santuário inacessível. Todos os que haviam falado dela, o haviam feito como cegos. Somente ele fala dela como um sábio em seu Tratado de Teologia e Política, pois é certo que jamais homem algum conheceu tão bem quanto ele as antiguidades judaicas.
Embora não exista ferida mais perigosa que aquela da maledicência, e nem menos fácil de suportar, jamais se lhe ouviram falar com ressentimento contra os que o despedaçaram.
Não só as riquezas não o tentavam como também não temia as consequências desagradáveis da pobreza. A [Sua] virtude o havia colocado acima de todas estas coisas; e embora não estivesse nas boas graças da fortuna, jamais a adulou nem murmurou contra ela. Se sua fortuna foi das mais medíocres, sua alma, em recompensa, foi das [maiores e das] melhores dotadas de tudo aquilo que faz os grandes homens".
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